07-06-2012
Jangamo, Inhambane, Moçambique
Outro dia de despedida,
outro dia frenético.
"Nada é fácil" é
uma verdade já confirmada em Moçambique. As pessoas "hão-de ir",
"hão-de vir", "havemos de fazer" e o que for, "há-de
ser". Nunca com sentido de urgência ou com prazos previamente
estabelecidos.
Hoje foi a saga da
impressão dos cadernos de apontamentos que queríamos deixar aos alunos com todas
as disciplinas e aulas que demos, desde o espanhol ao seminário da Internet.
Conseguimos resumir tudo em 24 páginas mas precisávamos de imprimir uma vez
para pôr a fotocopiar na escola secundária. Os computadores têm vírus que
destroem os ficheiros, a impressora não quer funcionar, as pens não são
reconhecidas, a electricidade vai abaixo, não temos o software da
impressora... Tudo o que pode acontecer, acontece, e a salvação é um dos alunos
ir à vila de bicicleta buscar um cd
para usar no computador da Irmã Laurinda com o ficheiro. Desde as 6:30 às 9:30.
De seguida, pôr a fotocopiar. O homem assegurou-nos que tinha folhas
suficientes, "não tem problema", mas deve ter feito mal as contas, ou
não as fez, e achou que uma resma chegava para 2500 cópias... Claro que ao fim
dos primeiros dez cadernos ficou quatro horas à espera que o amigo fosse
comprar mais. Nisto é hora de nos irmos embora e ainda tinha que faltar o toner.
É nestes momentos em que baixamos os braços e nos entregamos à vontade dos
elementos. Distribuímos os cadernos que ficaram prontos, o dinheiro para que a
Lina pagasse quando estivesse o trabalho concluído e tudo há-de ficar
resolvido.
Fomos almoçar ao refeitório
com os alunos internos, o que já devíamos ter feito há mais tempo. As condições
são as mais básicas, com talheres e copos de plástico insuficientes para servir
a todos e, dizem eles, a ementa não variar muito entre xima e feijão e arroz e
feijão. Hoje foi arroz com caril de amendoim de peixe, não sei se por ser dia
de festa. Organizámos um sorteio das nossas coisas que podíamos deixar, entre
roupa, lápis, um guarda-chuva, mochilas e mesmo umas colunas. Ficaram loucos, a
cara de felicidade deles foi impagável. O Pupai, um dos alunos que não precisa
de fazer nada para que eu queira estar a todo o momento a olhar para ele
sabendo que me vou rir, recebeu um guarda-chuva, que achou apropriado levar
aberto para a aula seguinte.
Na despedida,
escreveram-nos mensagens amorosas, dedicatórias e até lembranças para levarmos.
As frases são sempre muito poéticas: "Vós amo como se fossen o meu curação
direito. Não me esquenci do voço cabelo", "Vocês foram uma segunda
mãe para nós no mundo das ciências" e a história do Bresneves sobre um
pequeno-almoço com "pri-pir" entre mim e ele. Disseram que nós os
íamos abandonar, que agora iam emagrecer e deixar de conseguir dormir, que
temos que voltar... Estes miúdos não existem e até houve choradeira sentida
mesmo nos últimos momentos. Hoje estou simplesmente exausta e não consegui
ainda absorver tudo e perceber como me sinto, mas de certeza que levo muitos
momentos comigo de cada um deles.
No caminho para Jangamo,
soubémos que o Frei Filipe ainda estava em Maputo e achámos que assim mais
valia voltar para Maxixe e deixar tudo tratado com as fotocópias. Mas o Frei
Viegas achou que estava toda a gente a brincar com ele e que nós tínhamos era
que ir para Jangamo. Ainda parámos nos chineses para comprar um telemóvel à
Lina - que já tem quase 16 anos, afastada dos pais e não consegue falar com
ninguém - e a Sofia ofereceu o dela ao Júlio. O Frei também não deve ter achado
graça nenhuma e nem sequer se chegou a despedir de nós com mais do que um
"Tchau" virando costas... Não é alguém que vamos levar no coração,
com certeza, mas também não é nada que não me impeça de dormir.
A Lena telefonou e foi tão
bom ouvir a voz dela, já sinto falta dos amigos e família, é sinal que também
gosto muito do que me espera em Portugal.
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