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domingo, 24 de junho de 2012

Moçambique #52


07-06-2012
Jangamo, Inhambane, Moçambique

Outro dia de despedida, outro dia frenético.

"Nada é fácil" é uma verdade já confirmada em Moçambique. As pessoas "hão-de ir", "hão-de vir", "havemos de fazer" e o que for, "há-de ser". Nunca com sentido de urgência ou com prazos previamente estabelecidos.

Hoje foi a saga da impressão dos cadernos de apontamentos que queríamos deixar aos alunos com todas as disciplinas e aulas que demos, desde o espanhol ao seminário da Internet. Conseguimos resumir tudo em 24 páginas mas precisávamos de imprimir uma vez para pôr a fotocopiar na escola secundária. Os computadores têm vírus que destroem os ficheiros, a impressora não quer funcionar, as pens não são reconhecidas, a electricidade vai abaixo, não temos o software da impressora... Tudo o que pode acontecer, acontece, e a salvação é um dos alunos ir à vila de bicicleta buscar um cd para usar no computador da Irmã Laurinda com o ficheiro. Desde as 6:30 às 9:30. De seguida, pôr a fotocopiar. O homem assegurou-nos que tinha folhas suficientes, "não tem problema", mas deve ter feito mal as contas, ou não as fez, e achou que uma resma chegava para 2500 cópias... Claro que ao fim dos primeiros dez cadernos ficou quatro horas à espera que o amigo fosse comprar mais. Nisto é hora de nos irmos embora e ainda tinha que faltar o toner. É nestes momentos em que baixamos os braços e nos entregamos à vontade dos elementos. Distribuímos os cadernos que ficaram prontos, o dinheiro para que a Lina pagasse quando estivesse o trabalho concluído e tudo há-de ficar resolvido.

Fomos almoçar ao refeitório com os alunos internos, o que já devíamos ter feito há mais tempo. As condições são as mais básicas, com talheres e copos de plástico insuficientes para servir a todos e, dizem eles, a ementa não variar muito entre xima e feijão e arroz e feijão. Hoje foi arroz com caril de amendoim de peixe, não sei se por ser dia de festa. Organizámos um sorteio das nossas coisas que podíamos deixar, entre roupa, lápis, um guarda-chuva, mochilas e mesmo umas colunas. Ficaram loucos, a cara de felicidade deles foi impagável. O Pupai, um dos alunos que não precisa de fazer nada para que eu queira estar a todo o momento a olhar para ele sabendo que me vou rir, recebeu um guarda-chuva, que achou apropriado levar aberto para a aula seguinte.

Na despedida, escreveram-nos mensagens amorosas, dedicatórias e até lembranças para levarmos. As frases são sempre muito poéticas: "Vós amo como se fossen o meu curação direito. Não me esquenci do voço cabelo", "Vocês foram uma segunda mãe para nós no mundo das ciências" e a história do Bresneves sobre um pequeno-almoço com "pri-pir" entre mim e ele. Disseram que nós os íamos abandonar, que agora iam emagrecer e deixar de conseguir dormir, que temos que voltar... Estes miúdos não existem e até houve choradeira sentida mesmo nos últimos momentos. Hoje estou simplesmente exausta e não consegui ainda absorver tudo e perceber como me sinto, mas de certeza que levo muitos momentos comigo de cada um deles.

No caminho para Jangamo, soubémos que o Frei Filipe ainda estava em Maputo e achámos que assim mais valia voltar para Maxixe e deixar tudo tratado com as fotocópias. Mas o Frei Viegas achou que estava toda a gente a brincar com ele e que nós tínhamos era que ir para Jangamo. Ainda parámos nos chineses para comprar um telemóvel à Lina - que já tem quase 16 anos, afastada dos pais e não consegue falar com ninguém - e a Sofia ofereceu o dela ao Júlio. O Frei também não deve ter achado graça nenhuma e nem sequer se chegou a despedir de nós com mais do que um "Tchau" virando costas... Não é alguém que vamos levar no coração, com certeza, mas também não é nada que não me impeça de dormir.

A Lena telefonou e foi tão bom ouvir a voz dela, já sinto falta dos amigos e família, é sinal que também gosto muito do que me espera em Portugal.

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