08-05-12
Falta inspiração para escrever, essa que é necessária mesmo para o mais
simples dos parágrafos...
A nossa breve partida já é tema de conversa e planeiam-se jantares de
despedida, lembranças para quem nos acolheu e troca de contactos. Há uma
urgência de querer estar, saber, fazer, escutar, olhar e memorizar.
Na escolinha, monopolizei a manhã para fazer a tal ficha com os dados dos
miúdos e deixar à turma. É moroso e exige paciência perguntar a 36 miúdos entre
os 4 e 5 anos, a idade, comida e cor preferidas, o que querem ser quando forem
grandes e a que é que gostam mais de brincar, para além de os ir mantendo
entretidos enquanto se vai ao lado de cada um, tentar arrancar as respostas.
Isto em pouco mais de uma hora. Lá conseguimos, eu e a titia, e eles iam
desenhando o contorno da mão na folha e pintando-a. As respostas, muitas eram
dependentes das opções que eu dava. Por exemplo, como quase sempre recebia um
silêncio quando perguntava o que querem ser quando crescerem, dizia que podiam
ser médicos, enfermeiros, motoristas, polícias, professores, ter um café, e a
resposta tendia para a última opção que eu mencionava. Excepção foi um que
queria ser bandido e outro papá. Amoroso, não?
Outras vezes, independentemente do que eu perguntava, a resposta era
‘feijão’ e ‘matapa’. Suor e lágrimas à parte, o resultado foi satisfatório. Só
falta mesmo fazer um retrato a cada um e deixar a impressão digital na ficha.
A saga das bodas de ouro da Irmã continua. Os ficheiros da pen
voltaram a desaparecer mas lá conseguimos improvisar e acabar o vídeo. A saga
continua porque agora é preciso passá-lo para cds que a Irmã quer distribuir em
Portugal. Trinta e três. De vez em quando é que tomamos verdadeiramente atenção
aquilo que estamos a fazer e nos rimos com as frases poéticas da Irmã
acompanhadas de fotografias a condizer, tais como ‘Programar e planificar é o
contributo para uma vida organizada’ e a Irmã em frente a um ecrã de computador
com o desktop do Santo António.
Eu e a Sofia demos um saltinho ao hospital e a Joana ficou em casa à espera
duma entrevista telefónica com a ESADE. Telefonaram-lhe só mais tarde, quando
estávamos a sair do chapa, um ruído imenso na vila e ela ainda ofegante, mas
tudo correu de feição e ela conseguiu entrar logo no mestrado que queria! Tenho
a certeza que a emoção da banda sonora moçambicana ajudou.
Ao fim do dia, veio visitar-nos, mais uma vez, a Dona Rosária, que vem
amanhã connosco a uma comunidade remota aqui relativamente perto. As histórias
que ela e o Frei Filipe contaram do tempo da guerra... não devem sequer ser
comentadas. Não há palavras. De monstruosidade humana, de tortura... Ou se
estava com a Frelimo e contra a Renamo ou vice-versa, não havia inocentes aos
olhos dos fanáticos. Isso criou um banho de sangue, maioritariamente no campo,
toda a gente fugiu para a cidade. Imaginar que, a estrada que fazemos todos os
dias num quarto de hora para escolinha, era caminho para uma morte certa...
Ninguém podia circular, as comunicações foram todas cortadas, esta missão
estava abandonada e a degradar-se, familiares e amigos esventrados e
queimados... Durante desasseis anos.
É ouvir isto que me suga energia e inspiração.
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