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segunda-feira, 14 de maio de 2012

Moçambique #22


08-05-12

Falta inspiração para escrever, essa que é necessária mesmo para o mais simples dos parágrafos...

A nossa breve partida já é tema de conversa e planeiam-se jantares de despedida, lembranças para quem nos acolheu e troca de contactos. Há uma urgência de querer estar, saber, fazer, escutar, olhar e memorizar.

Na escolinha, monopolizei a manhã para fazer a tal ficha com os dados dos miúdos e deixar à turma. É moroso e exige paciência perguntar a 36 miúdos entre os 4 e 5 anos, a idade, comida e cor preferidas, o que querem ser quando forem grandes e a que é que gostam mais de brincar, para além de os ir mantendo entretidos enquanto se vai ao lado de cada um, tentar arrancar as respostas. Isto em pouco mais de uma hora. Lá conseguimos, eu e a titia, e eles iam desenhando o contorno da mão na folha e pintando-a. As respostas, muitas eram dependentes das opções que eu dava. Por exemplo, como quase sempre recebia um silêncio quando perguntava o que querem ser quando crescerem, dizia que podiam ser médicos, enfermeiros, motoristas, polícias, professores, ter um café, e a resposta tendia para a última opção que eu mencionava. Excepção foi um que queria ser bandido e outro papá. Amoroso, não?

Outras vezes, independentemente do que eu perguntava, a resposta era ‘feijão’ e ‘matapa’. Suor e lágrimas à parte, o resultado foi satisfatório. Só falta mesmo fazer um retrato a cada um e deixar a impressão digital na ficha.

A saga das bodas de ouro da Irmã continua. Os ficheiros da pen voltaram a desaparecer mas lá conseguimos improvisar e acabar o vídeo. A saga continua porque agora é preciso passá-lo para cds que a Irmã quer distribuir em Portugal. Trinta e três. De vez em quando é que tomamos verdadeiramente atenção aquilo que estamos a fazer e nos rimos com as frases poéticas da Irmã acompanhadas de fotografias a condizer, tais como ‘Programar e planificar é o contributo para uma vida organizada’ e a Irmã em frente a um ecrã de computador com o desktop do Santo António.

Eu e a Sofia demos um saltinho ao hospital e a Joana ficou em casa à espera duma entrevista telefónica com a ESADE. Telefonaram-lhe só mais tarde, quando estávamos a sair do chapa, um ruído imenso na vila e ela ainda ofegante, mas tudo correu de feição e ela conseguiu entrar logo no mestrado que queria! Tenho a certeza que a emoção da banda sonora moçambicana ajudou.

Ao fim do dia, veio visitar-nos, mais uma vez, a Dona Rosária, que vem amanhã­ connosco a uma comunidade remota aqui relativamente perto. As histórias que ela e o Frei Filipe contaram do tempo da guerra... não devem sequer ser comentadas. Não há palavras. De monstruosidade humana, de tortura... Ou se estava com a Frelimo e contra a Renamo ou vice-versa, não havia inocentes aos olhos dos fanáticos. Isso criou um banho de sangue, maioritariamente no campo, toda a gente fugiu para a cidade. Imaginar que, a estrada que fazemos todos os dias num quarto de hora para escolinha, era caminho para uma morte certa... Ninguém podia circular, as comunicações foram todas cortadas, esta missão estava abandonada e a degradar-se, familiares e amigos esventrados e queimados... Durante desasseis anos.

É ouvir isto que me suga energia e inspiração. 

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