que fosse uma hipérbole, do amor do marido duma das
minhas coleguinhas pelo Star Wars, ela ter caracteres da língua artificial do
filme, gravados no interior da aliança. Só me apercebi que não era uma piada
quando já a tinha a dita cuja na mão.
Páginas
domingo, 30 de setembro de 2012
hoje fui à minha vida e não estava à espera…
Era inevitável começar a registar os eventos e as peripécias
diárias da minha vida tão diferente da anteriormente retratada, com
Moçambiques, Índias, e afins. A vida de fussice no escritório tem me aberto os
olhos para o mais trivial, tragicómico e ridículo das aventuras de cada um de
nós. Isso, ou já ando a bater mal de passar 8 horas em frente a tanta folha
Excel.
Porque hoje fui à minha vida, e uma das contabilistas
contrastou a primeira ida à medicina do trabalho com a minha, sendo que a dela
foi a preencher dados online, com uma aparelho de medir a tensão ao lado para
ela se servir, e a médica do outro lado a querer que ela aproximasse o olho da
webcam para confirmar que estava tudo bem. Se não estivesse, a médica informava-a
posteriormente, por e-mail.
quarta-feira, 11 de julho de 2012
Moçambique #61
17-06-2012
Um dia digno de ser o último foi o que
planeámos e executámos, apesar do melhor vir sempre sem avisar.
Voltámos à feira de artesanato, pois as
meninas tinham ouvido falar dos batiks: um pedaço de pano branco onde desenha
um artista e vai-se mergulhando em tinta de determinada cor para depois
bloqueá-la, com cera, a parte que queremos manter assim. Enceramos logo no
início aquelas que queremos manter brancas e vai-se mergulhando em várias cores
e encerando. Os padrões são tudo aquilo que tenha um toque africano. E como o
mundo não é maior que uma castanha de caju, encontrámos a Viki, que conhecemos
em Homoíne, nas redondezas.
Siga de riquexó para a praia que nos
disseram ser a melhor, a Marés, na Costa do Sol, a 5 quilómetros da casa. Em
termos de beleza natural já sabíamos que não ia ser espectacular mas amei as
horas lá passadas. Quase todos os portugueses estavam na esplanada mas esta
tinha uma estrada à frente e só então a praia. E como nós já somos praticamente
moçambicanas, quisemos o real deal.
Abastecemo-nos com um papo seco enorme e quentinho, do centro comercial colado,
mais uma coca-cola, e fomos estender as capolanas em frente às dezenas de
barracas a vender frango de churrasco e batata frita (aqui pouco existe o
conceito de diferenciação), às cadeiras e mesas de plástico e aos comensais
locais. Estivemos sempre a mudar de spot porque a maré não parou de subir e
cedo não havia espaço para nós e os que queriam jogar à bola! Os miúdos tomavam
banho de roupa, os mais velhos bebiam Laurentinas e estas (na praia ainda mais)
branquinhas de papo para o ar, como se nunca tivessem estado noutro lugar. Fez-me
gostar ainda mais deste país, sentir-me em casa num Domingo à tarde entre
amigas.
O fim de dia foi passado em “até já”s,
presenciais, telefónicos e escritos, e a fazer a mala.
No aeroporto, encontrei os maiores
atrasados até à data, começando pelo segurança do raio X, que
perguntou se eu não lhe queria deixar os meticais que me tinham sobrado,
passando pelas funcionárias de todas as lojas que não tinham troco e achavam
isso normalíssimo, e acabando nos quatro do posto de controlo dos passaportes,
que me gozaram à força toda e ameaçaram de multa por causa do visto que tinha
expirado ontem. Vão-se fumar, como gostam de dizer! Enfim, valeu a vitória de
Portugal a que assistimos com os outros viajantes nos ecrãs espalhados por lá!
Não gosto de conclusões, de resumos, nem
de melancolias mas este relato tem que acabar neste dia de regresso. Sei que
Moçambique não me vai sair dos ossos e as lições a tirar se devem repercutir
para o resto da minha vida. Não me cabe a mim ter já noção de quais as são mas
ao tentar deixar aquilo que trazia comigo, levo lembranças de valor
incalculável, caras muito amigas, mensagens poéticas no telemóvel e muita,
muita dança e alegria. Não há como negá-lo, esta malta dá aquilo que não tem,
através duma maneira de viver mais simples que a nossa mas dando valor ao que
interessa. Vou com uma pitada de maturidade mas de consciência duma enorme inexperiência
em relação a tudo. É como se se tivesse aberto mais uma porta para mim. Vou, mas
sabendo que na ida está sempre latente um regresso.
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Moçambique #60
16-06-2012
Quem diria que chegávamos a vir a um
museu em Moçambique? O escolhido foi o de História Natural, onde vimos muito
bicho empalhado, artefactos de tribos africanas de há muitos anos mas que, hoje
em dia, se continuam a usar, e ilustrações da fauna e flora com ar do século
passado. Mas o meu recanto preferido foi o de um conjunto de embriões de
elefante, em várias fases de gestação, conservados em “formaldeído”,
acompanhados duma explicação de que tinha sido “o Sr. Carreira a
aproveitá-los duma matança, feita por outros, e que hoje isto não seria
possível de replicar”. Andámos na nossa vidinha, feitas independentes, com o
nosso melhor amigo, o riquexó ou “chopela”. É rápido, fresco, barato e só é
pena não haver mais cá nem em Portugal!
Num instante pusemo-nos no mercado
central, onde a secção da fruta foi, sem dúvida, a melhor por onde já passei e
que, por isso mesmo, me surpreendeu. Aviámo-nos de tudo o que é indispensável
levar connosco na mala: caju, cana-de-açúcar, mandioca, e banana-maçã. O
mercado tinha também uma parte, maravilhosa, dedicada a cabelos (com,
literalmente, baldes de amaciador e tudo quando é cremes), outra de artesanato,
peças de mecânica e os mais variados alimentos.
Verdadeiramente tugas e por indicação da
Roxanne, amiga conhecida em Lisboa mas de cá, fomos ao
restaurante/padaria/pastelaria dos pais dela, o Cristal, para satisfazer os
nossos desejos mais profundos de gordas. Tínhamos à escolha: cozido à portuguesa,
pastéis de bacalhau, bolos de arroz, marisco… tudo o que nos pudesse apetecer!
Eu fiquei-me por um croissant com
queijo e uma coca-cola, que me souberam a pato.
Acabámos o dia numa festa da Heineken, no
Desportivo na baixa da cidade, promovida pelo irmão Licussa mais velho, com as
manas já nossas amigas e que são duma simpatia incalculável, tal como a maioria
das pessoas que temos vindo a conhecer.
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quinta-feira, 28 de junho de 2012
Moçambique #59
15-06-2012
Estamos
a voltar aos poucos para casa mesmo estando ainda em Maputo. É uma boa
transição, tendo em conta que a nossa realidade têm sido terrinhas equivalentes
a uma Freixo de Espada-à-Cinta.
Conhecemos
um senhor chamado Cunha Vaz e a mulher, Fernanda, portugueses nascidos em
Coimbra mas que sempre viveram em Moçambique e agora estão em Inhambane, desde
há muitos anos. Adorei ouvir as histórias provenientes dos seus mais de 80 anos
de vida e ainda os seus projectos para o futuro! Contaram muitos momentos
amargos da independência, quando quase tudo o que tinham foi nacionalizado e
foram expulsos do país durante algum tempo. Admiro a sua resiliência e
capacidade de perdoar e andar para a frente, sem mágoa, apesar de não
esquecerem. Agora só pensam em transformar uma propriedade, em Inhambane, num
orfanato para meninas dos 5 aos 10 anos, em sociedade com o Bispo, e quiseram
os nossos contactos para, quando tudo estiver pronto, irmos para lá trabalhar.
O dia
foi em companhia do Frei Evódeo, um homem muito carinhoso e sereno, com uma
paciência santa para nos levar a ver os spots
da cidade. Passámos pelos caminhos-de-ferro, onde ele nunca tinha ido; por uma
loja de artesanato com potenciais lembranças brutais, entre estátuas, caixas e
caixinhas, pentes e anéis de pau-preto e pau-rosa, mochilas de cabedal e
etecéteras; pela marginal, de seu ar tão bonita e pacífica mas, dizem, perigosa
e deserta; e pelo fabuloso Jardim dos Namorados, mais cuidado do que qualquer
outro e, só para não abusar, com um banquinho debaixo duma árvore com vista
para o imenso mar. Ficámos por lá a tomar um cafézinho e, isto sim, é o meu
tipo de turismo.
E como
as estrelas têm estado sempre alinhadas para nós, já não bastava um luxo de um
banho de água quente saída directamente da boca do chuveiro, a noite foi épica
e o extremo oposto do que até aqui temos vivido. O Frei apresentou-nos uma
família amiga, os Licussa, que muito amavelmente nos abriram as portas de casa
e nos trataram como se fôssemos membros da mesma. Estivemos juntos ao serão,
entre chamuças, rissóis de camarão e Lovoka
(um vodka de caramelo delicioso) a
conversar sobre as nossas vidas, a situação do país e tudo o que vem à baila
quando se está entre amigos. Levaram-nos depois ao spot nocturno mais cobiçado, o Ice Lounge, onde o Pito, um dos
irmãos, é promotor e fez com que nos sentíssemos rainhas mesmo envergando um outfit bastante “missionário”. Ficámos
na parte das mesas com champanhe trazido até nós e no meio do que posso apenas
descrever como dezenas de Rihannas.
Elas estavam nos trinques, com micro saia ou leggings de cabedal, um dia de salão de beleza em cima, retiradas
do que poderia ser um million dollar
videoclip americano. Os moves de
dança eram fascinantes e eu bem que tentei aprender com as três irmãs da
família mas em vão. Fiquei com muita vontade de aperfeiçoá-los em casa para
depois poder estar a par com elas! Mexer o corpinho assim é uma arte que
liberta e faz muito bem…!
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Moçambique #58
14-06-2012
Maputo, Moçambique
Ficámos
mal habituadas com o autocarro que nos tinha levado para o Chimoio, que mais
parecia um avião. Precisávamos de ter o real
deal, e foi o que não faltou!
O Frei
quase levou as mãos à cabeça quando olhou para dentro do autocarro mas nós só
nos conseguíamos rir. Acordámos às 4:15 e partimos um bocadinho antes das 7:00
do Inchope numa viatura que só consigo descrever como um chapa de 100 lugares
ou o que seria a Carris há 20 anos, com amontoados de malas em tudo quanto era
espaço sem cadeiras. Ar condicionado é uma miragem, casa-de-banho foi um bidé
numa paragem a meio das 14 horas até Maputo, o condutor era vesgo e sempre o
mesmo, a velocidade furiosa e, a cada ultrapassagem, parecia que estávamos uma
sala de cinema, com o público sempre em suspense
e sustendo a respiração. Eu, cada vez que olhava pelo vidro dianteiro,
rezava 3 Avé Marias.
A
antecipação foi pior do que a viagem em si. Bebi pouca água para aguentar as
longas horas sentada; diverti-me a ver o condutor acelerar enquanto alguns
faziam as suas necessidades a um metro do autocarro quando este parava para
alguém descer; maravilhei-me com os negócios que é possível fazer através duma
janela de camioneta; e exasperei com as inspecções a cada mudança de distrito
(que consistem num guarda a olhar para os passageiros e, num ou noutro caso,
aceitar uns trocos do condutor).
Mas um
dos melhores momentos foi, sem dúvida, o manager
da camioneta abrir as luzes quando já estava tudo em escuridão total e chamar:
“Carolina? Estão a pedir para atender o telemóvel!” pois o Frei Filipe estava a
tentar ligar-me e, vendo que eu não atendia, ligou para ele, pois está claro.
Agora
estou de volta ao local onde tudo começou e que, na altura, me provocou muitos
sentimentos díspares. De dúvida, de motivação, de medo e de curiosidade. Foi
uma micro-vida que se deu entretanto. Ainda não tenho respostas, só perguntas:
o que será que transformei ou afectei, para melhor e para pior? A quem
influenciei e a quem passei despercebida? Como será voltar a casa e um dia
regressar a Moçambique? O que mudou em mim e o que é que se mantém? Hoje só sei
que as folhas e os lápis escasseiam, que estou quase tão branca como quando vim
e que me sinto exausta mas em paz.
Moçambique #57
13-06-2012
Não há
coincidências e, no dia 13 de Junho, estamos numa paróquia apadroada pelo nosso
Santo António.
Temos missa celebrada pelo reitor, o Frei Miguel, da
Universidade Católica de Moçambique, a 20 passos do nosso quarto.
É dia
de festa, desta vez, não com broa e sardinha mas com frango, porco, batata
frita e maionese – um prato dito típico mas que não é mais que a nossa salada
russa. Como disse o Frei Filipe, por bebermos “pretinha”, ficamos com os
“anjinhos na cabeça”. E se fosse só a Laurentina… é vinho português, espumante,
Cutty Sark e Amarulla, um licor sul-africano tipo Baileys, que foi a minha escolha.
Foi um
almoço para mais de 100 pessoas, entre alunos, pais, frades e irmãs. Com muita
imaginação, fazia lembrar aquele salão de jantar do Harry Potter, com os cabeças da festa numa mesa comprida elevada,
virados para os alunos, mas, desta vez, no salão paroquial erigido pelo Frei
Vítor que também serve para celebrar a missa.
E não
há festa que se preze sem dança e eu já entrei nesse espírito, quer seja para
uma marabenta com os alunos ou a passada com um Frei.
Houve
até umas peças preparadas pelos alunos: cantaram, dançaram e fizeram teatro
(que continuam, para nós, e não somos as únicas, a serem imperceptíveis).
Admiro-os muito por criarem sempre estes momentos que trazem sorrisos e muita
descontracção. Apenas com um bater de palmas ritmado puseram toda a gente a
dançar e a tal “alegria na pobreza” não deixa de ser constatada e é uma lição
semelhante a outra que já trazia comigo, de que “só as pessoas entediantes é
que se entediam”. E não há razão para não haver entretenimento quando, onde e
como quer que seja.
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